16.5.18

A SEDE


Nasceram há muito
inda o país era um desejo
de terras férteis águas mornas
onde pousar a espada e acasalar


Guerrearam os que chegavam


Não sabiam que partilhada

a terra cresce  e alimenta
a água brota e dessedenta

Deuses com deuses nunca se entenderam


Os homens com eles aprenderam
a vigiar dos altos quem se atreve
a cruzar o caminho da abundância

a cobiçar mulheres do outro dono

Pedra sobre pedra subiram torres
muralhas a proteger as torres
fortes e fortins e revelins

A cidade cresceu encarcerada
nas pedras do seu medo
até que os homens se atreveram
ao campo aberto e livre
na paz da vizinhança

Hoje passeiam o olhar 
pela inutilidade dos castelos

A água brota lá dos fundos
benfazeja e morna

Nos homens adivinha a persistência
da sede de outros muros

Licínia Quitério

8.5.18

TRAVESSIA


A noite em terra alheia é promessa 

de conforto e resguardo,
de novos convivas em redor da mesa,
em redor da afinação das vozes,
solitárias ainda e logo mais soando
em tímidos duetos
até que a embriaguez aquém do vinho
aclare e aqueça e a palavra se faça
caminho e destino da viagem.

Lá fora estão as árvores pujantes
e as fontes quentes e o rio manso
com os  peixes prateados.
Tudo contido em seus limites
como se falássemos de quadro 
concebido e pintado por um monge
na média luz do claustro.

Se a promessa se cumpre eu já não sei.
Sei das luzes que se acendem na rua,
da renda de sombras nos vidros da janela,
do rumor da água do rio sob as pontes.
Só me falta saber quando farei a travessia.

Licínia Quitério

1.5.18

A DOR DO RIO


O homem não sabia a fundura do colo
Pensou na mãe
Disse estou aqui vou-me deitar estou cansado
Disse acorda-me amanhã devagarinho
Foi abaixo e voltou
e voltou e voltou
O rio estremeceu
Do suspiro do homem nasceu um remoinho
Depois tudo ficou sereno e limpo
Um corpo deitado na corrente
A gente sabe lá a dor de um rio
quando se afoga um homem

Licínia Quitério

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